Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 06.01.2022
24.01.2022
1- No procedimento a que se refere o artº 21º nº 7 do DL 149/95, na redacção dada pelo DL 30/2008, o juiz antecipa o juízo de solução definitiva do caso subsumindo os mesmos factos às mesmas previsões normativas da providência de restituição provisória do bem, para produzir os mesmos efeitos jurídicos daquela que seria a acção principal a interpor posteriormente que, assim, é dispensada.
2- Para efeitos de antecipação do juízo de solução definitiva do caso, nos termos do artº 21º nº 7 do DL 149/95, na redacção dada pelo DL 38/2008, não tem de se proceder, de novo, a uma análise crítica das provas e a uma fundamentação da convicção do juiz nos termos do artº 607º nº 4 do CPC. Ou seja, o juízo de antecipação produz-se subsumindo os mesmos factos às mesmas previsões normativas já considerados na decisão provisória cautelar.
3 - Do mesmo modo, não têm de ser apreciadas, em sede de juízo de antecipação da solução definitiva, quaisquer excepções que tenham sido opostas em sede de oposição ao procedimento cautelar.
4 - Tendemos a considerar não ser exigível, para efeitos do artº 808º nº 1, 2ª parte do CC, que o credor esclareça, rectius, advirta de modo expresso o devedor que, se não cumprir a prestação durante aquele prazo suplementar concedido, a “simples mora” se converterá em “incumprimento definitivo”: a natureza peremptória do prazo suplementar pode ser apreendida do contexto da declaração nos termos gerais do artº 236º do CC.
5 - A adequação ou razoabilidade do prazo suplementar peremptório afere-se atendendo às circunstâncias do caso, relevando a natureza da prestação (no caso pecuniária), o reiterado incumprimento das prestações/rendas mensais, a frequência com a locadora a interpelou para pagar, a persistência em não cumprir, a proposta e aceitação de plano de recuperação que também não foi cumprido, o número de rendas mensais em dívida e respectivo montante total e ainda a circunstância de o contrato de locação financeira em causa ser consequência de (re)negociação de um contrato anterior, sobre os mesmos bens, que havia sido, igualmente, incumprido. Assim, afigura-se-nos que o prazo suplementar concedido, por carta de dia 6, até ao dia 14, para que a locatária (peremptoriamente) cumprisse, apesar de só ter sido recebida aquela carta a 11, é um prazo razoável.
6 - Depois de terminar o prazo suplementar sem que o devedor realize a prestação, a obrigação não cumprida aproxima-se, temporária e transitoriamente, de uma obrigação de faculdade alternativa a parte creditoris. Em consequência, o credor pode optar por exercer o direito subjectivo ao cumprimento, ou o direito subjectivo à indemnização, ou o direito potestativo à resolução.
7 - Após o decurso do prazo suplementar peremptório e antes de o credor exercerqualquer desses direitos, o devedor tem a faculdade de oferecer ao credor a prestação em falta. Mas o credor tem a faculdade de a aceitar ou não.
8 - Tendo sido feita transferência bancária, em data posterior ao termo daquele prazo, para a conta do credor, pela totalidade das rendas em falta que motivaram a fixação de prazo suplementar peremptório, no mesmo dia em que a credora emitiu a declaração de resolução contratual, para que pudesse considerar-se inválida a declaração de resolução, o devedor teria de alegar e provar que o credor aceitou aquele depósito a título de cumprimento (posterior) daquelas rendas. (Sumário elaborado pelo Relator)